Alameda: a quase sede da Copa do Mundo de 1950

Por Ives Teixeira Souza


Esta é a terceira parte da reportagem sobre o Estádio Alameda.
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Em 21 de agosto de 1948 foi lançada a pedra fundamental do futuro estádio de Belo Horizonte, o campo do Sete de Setembro, em terreno doado pela prefeitura, no bairro Horto Florestal, região leste da cidade. Dois dias antes, o jornal O Diário publicava informações da agência France Press sobre a Copa do Mundo de 1950.

A edição seguinte da Revista do América, editada pelo jornalista Januário Carneiro, destaca, ao reproduzir o texto do O Diário, no alto da página “Jogos do Campeonato do Mundo serão realizados na Alameda”, acrescentando “Confirma-se a notícia que o magno certame será mesmo no Brasil”. Porém, em momento algum o texto da agência de notícias internacional afirmou em quais cidades aconteceriam os jogos, muito menos em quais estádios. Inclusive, o texto só confirmava a data de realização dos jogos, entre 15 de junho e 15 de julho.




Revista do América repercutiu erroneamente informação que não existia. Fonte: Revista do América – Outubro/1948

Como o Alameda era o melhor estádio de Belo Horizonte até então, o América noticiou que o Alameda seria um dos estádios da 4ª Copa do Mundo de Futebol, realizada pela Federação Internacional de Futebol (FIFA). Mas essa informação nunca foi confirmado pela FIFA, que ainda àquela época não tinha definida a participação de Belo Horizonte como cidade sede.

Outro erro do jovem Januário Carneiro, que editava outras revistas de esporte na cidade, nessa edição era a vanglorização da parceria entre o torcedor americano, o prefeito Negrão de Lima e o vereador Antonio Lunardi, que permitia a promessa de conclusão das obras do estádio do Sete de Setembro, com a capacidade para 40 mil pessoas, em 1949.

O caminho de Lunardi

Antonio Lunardi era presidente do Sete de Setembro e vereador de Belo Horizonte desde 1947, mesmo ano em que assumiu a presidência do clube do bairro Floresta. Em 1951, assumiu uma cadeira na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Também empresário, era dono de uma fábrica de ladrilhos e marmoraria.

Desde que assumiu a presidência do clube, o político buscava construir um estádio para o Sete. A ausência da formação de uma grande equipe era justificada pela falta de um estádio à altura do que o Sete poderia vir a ser. Essa ideia também era acentuada pela imprensa esportiva, que ficou empolgada com as promessas de Lunardi de construir o terceiro maior estádio do Brasil.




Antonio Lunardi lança a pedra fundamental do estádio do Sete em agosto de 1948. Fonte: Revista do América – Outubro/1948

Com a doação do terreno pela prefeitura, somada à colaboração do “dinheiro do Otacílio” são iniciadas as obras no terreno, ainda em 1948. Buscando recursos para a conclusão da obra no ano seguinte, como prometido, Lunardi viaja para o Rio de Janeiro, como noticiou o Folha de Minas, com o objetivo de confirmar Belo Horizonte e o novo estádio como participantes da Copa do Mundo. O que obrigaria a Prefeitura a ajudar no término das obras.

A partir de ampla cobertura da imprensa carioca, a Confederação Brasileira de Desportos (CBD) confirmou a capital mineira como sede, desde que o estádio setembrino estivesse pronto. Diante da possibilidade real do evento, o alamedino Otacílio Negrão de Lima não teve outra escolha, a não ser colaborar para a entrega da obra. Caso contrário, era a ausência de Minas Gerais e da capital mineira do maior evento de futebol do mundo, esporte que há muitos anos já era o mais popular entre os cidadãos.

Lunardi conseguiu o que tanto queria. Era o fim do sonho americano de fazer do Alameda o estádio-sede do Mundial de Futebol. Alameda que, em 1930, foi considerado pelo presidente da Federação Internacional de Futebol, Jules Rimet, em visita à Belo Horizonte, ser superior aos estádios da Copa do Mundo daquele ano, realizada no Uruguai, com a exceção do Estádio Centenário.

Os milhões para a festa

Depois de muito adiar, em agosto de 1949, Otacílio Negrão de Lima assinou o acordo da Prefeitura de Belo Horizonte com a Confederação Brasileira de Desportos (CBD), se comprometendo a entregar o novo estádio e a pagar a quantia de 240 mil cruzeiros para Belo Horizonte sediar os três jogos do evento. Além de garantir para a CBD uma renda mínima de 1 milhão e 500 mil cruzeiros, nas três partidas. “Da parte da Prefeitura existe boa vontade e desejo sincero de colaborar. Havemos de levar adiante as obras. Para isso é necessário, antes de tudo, um trabalho desinteressado e dedicado dos esportistas mineiros”, declarou o prefeito para a imprensa, na ocasião.




Obra do Independencia em 1949, após a prefeitura confirmá-lo como estádio da Copa. Arquivo Estado de Minas

Diante da desconfiança sobre a conclusão do projeto dentro do prazo previsto para a Copa do Mundo as obras foram aceleradas, com um amplo aparato de funcionários e caminhões pagos pelo cofre municipal. Não se sabe ao certo qual foi o valor gasto pelo município para a construção do estádio, o que não ficou evidenciado em nenhuma edição do relatório do prefeito. Mas em entrevista à Januario Carneiro, ao apresentar o andamento da construção do Independência, o presidente do Sete, Antônio Lunardi, afirmou que a obra tinha um “custo baixo, de 12 milhões de cruzeiros.”

A ciclicidade da relação entre clubes de futebol, estádio e políticos é visível no movimento realizado após a escolha do Brasil para sediar, pela segunda vez, uma Copa do Mundo de Futebol. O novo estádio Independência, reformado em 2011, custou 125 milhões de reais, sendo 30 milhões financiados pelo Governo Federal, por meio da Caixa Econômica Federal e o restante pelo governo estadual, em acordo firmado no mandato do governador de Minas Gerais, Aécio Neves. Político que foi uma espécie de “mecenas” do futebol mineiro no final da década de 2000, quando seu governo realizou três grandes reformas de estádios na Região Metropolitana de Belo Horizonte (Mineirão e Independência, em Belo Horizonte, e a Arena do Jacaré, em Sete Lagoas), tendo como justificativa a Copa do Mundo de 2014.




Imagem aérea do estádio em construção, em 1949. Arquivo Estado de Minas

Assim como recentemente, apesar do enorme gasto, tudo ficou pronto para o torneio de futebol. Em 25 de junho de 1950, foi realizado o primeiro jogo entre Suíça e Iugoslávia, já pela Copa. Mas na semana anterior, como teste, no dia 18, o Sete de Setembro abriu os portões do estádio para a torcida acompanhar um treinamento da equipe. Era o início de um novo patamar para o futebol de Belo Horizonte. E o início do fim do Alameda como um “gigante” estádio de futebol, sendo as grandes partidas do futebol mineiro realizadas no Independência.

O complexo esportivo do Alameda no esporte mineiro

Atletas de clubes rivais conviviam em meio às quadras campeãs do Alameda. Clique para ler a quarta parte da reportagem